Muitas vezes tive que explicar pra outros e pra mim mesma porque o governo, principalmente no Brasil, precisa mudar suas práticas. Geralmente digo que há uma dupla pressão pra mudança: aumento na demanda por serviços e, simultaneamente, severos limites ao orçamento. No caso brasileiro, a abertura democrática nos anos 80 e as mudanças na constituição de 88 fizeram com que mais serviços fossem exigidos do governo e um nível de qualidade mais alto fosse esperado. Ao mesmo tempo, a Lei de Responsabilidade Fiscal e o controle inflacionário trouxeram austeridade para os gastos públicos. Neste cenário, a inovação seria uma questão de sobrevivência das instituições governamentais.
Ultimamente, porém, tenho pensado que a necessidade de reinventar o governo vai muito além, e inclui em última instância pensar que tipo de sociedade desejamos. Adam Curtis faz uma excelente (ainda que polêmica) síntese dos dilemas que temos enfrentado no mundo ocidental. Seu último documentário, “The Trap” (“A Armadilha”), passa pela Guerra Fria, pelos índios Ianomâmis, por John Nash e pela Nova Gestão Pública. Claro que não dá pra resumir a série, apresentada em três domingos seguidos pela BBC, em poucas palavras. Mas o que ficou como mensagem pra mim é o fracasso do “Estado Mínimo”, também conhecido como “Neoliberalismo”, etiquetas para a crença no Mercado e sua “Mão Invisível” como a solução para todos os males da humanidade.
Nesta linha, vale citar também o ponto de vista do excelente Alfons Cornella, idealizador do projeto Infonomia. No artigo “Economia Suicida”, Cornella e Rucabado descrevem a tensão entre o individualismo extremo, tão característico das sociedades consumistas e imediatistas, e a realidade de que a raça humana precisa conviver em rede, de maneira ecossistêmica. A economia mais poderosa do mundo genuinamente acredita que qualidade de vida é igual a consumo, e portanto exporta para o resto de nós não somente seus produtos, mas a sua visão distorcida e insustentável de desenvolvimento.
Já sabemos que o Estado Totalitário e onipresente não é a resposta. O modelo de administração burocrática, altamente hierarquizada e padronizada, que normalmente se associa a este tipo de governo, seguramente não é o ideal, e talvez sequer seja possível. O outro extremo, em que o Estado sai de cena e deixa a livre competição dar conta do recado, também se demonstra inviável. Na mesma linha, importar de idéias do mercado como solução para as organizações governamentais (por exemplo compreender o cidadão como cliente, implantar remuneração por resultados para servidores públicos, adotar a busca de eficiência como critério prioritário) em geral vai de encontro aos valores básicos do setor público. Mas então, que direção tomar? Sim, precisamos inovar nossas práticas governamentais, precisamos reinventar o governo, rever o papel do Estado. Mas, será que sabemos pra onde queremos ir?
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